Aí que eu fiquei gripada duas vezes seguidas. Confesso que tomei tudo errado meu remédio. Mas eu estava mais preocupada com resiliência e testes psicológicos do que com antibiótico. Então que eu fui ao hospital, parei numa vaga horrível, pensando que era boa e fiz uma caminhada que durou cinco minutos até chegar à nova recepção do Centro Médico. Cheguei e me senti em alguma novela das nove, numa recepção que daria pra dar uma festa pra trezentos convidados, cheia de mármore e televisões de plasma. Em comparação àquela salinha que lotava de gente antes, essa de agora arrasou! Não que o hospital fosse ruim, não é. É um dos melhores de Campinas, senão o melhor, mas isso não vem ao caso. Enfim, como tenho o péssimo hábito de ter preguiça de pegar bolsa antes de sair de casa, estava abraçada com livro, lápis, papéis e carteira. A intenção era ler, mas o inverno pegou não só a mim, como pegou umas criancinhas fofas e eu me entreti olhando para elas, só pra variar. Uma era meio estranha e sociável demais. Veio pegando chave do meu carro e derrubando e querendo ver e mexer e eu só não dei uma bronquinha porque ela tinha um nome gringo, a avó era brava e a mãe completamente esquisita. Aí eu entrei e um médico bá-tchê me atendeu, na maior malemolência gaúcha. Acontece que meu livro chama A função do orgasmo (recomendo àqueles que entendem pelo menos o básico de psicologia, senão fica difícil) e tem uma capa super sensual, vermelha e tals. Coloquei o livro na cadeira e, em cima dele, a carteira e as outras bugigangas. O queridíssimo, com nenhuma licença, deu uma fuçadinha no título e:
- Como é que chama?
- A função do orgasmo. ("ó céus, piadinha, não!")
- Você ficou com vergonha, por isso escondeu o livro?
Risada blasé, e:
- Não! Eu só não quis ocupar as duas cadeiras, sendo que tudo cabia numa só.
Risada blasé, agora da parte dele, e:
- E qual é a função do orgasmo? (sabia!)
- Eu tô na introdução ainda, mas imagino que, de acordo com a teoria do cara, tenha a ver com a boa manutenção da vida. (viu, meu pulmão vai explodir a qualquer momento, qual é a função disso?)
Nessa hora eu tive vontade de acrescentar um "o que é super compreensível", depois de "boa manutenção da vida", mas preferi continuar dizendo que era pro meu curso de psicologia. Sem querer soar convencida, afinal, eu deveria estar o ó do borogodó naquela noite de sexta-feira, mas eu não queria nenhum médico punheteiro pensando em mim como a menina do orgasmo. Esse pensamento tem copyright.
Eu só sei que, no final das contas, eu saí do hospital com uma receita, raio-x mostrando lá meu pulmão lindo e limpíssimo, tossindo feito uma desenganada, busquei minha namorada e fui pra balada. Ah, eu merecia, vai?
Até mais ler.